Lembro-me do dia em que deixei a casa que até então me tinha servido de ninho, aquela onde cresci e me tornei alguém.
Já há algumas semanas que tinha preparado a mala, com os meus parcos haveres, tal não era a minha vontade de liberdade! Algumas roupas, um ou dois pares de sapatos , as minhas cassetes de música preferidas e os objectos de higiene pessoal, nada mais!!
Todos temos, a dada altura da vida, uma necessidade enorme de voar... E a minha vez , tinha por fim, chegado.
A viagem foi feita de noite, por terras até então desconhecidas para mim. Sentia um misto de alegria e tristeza, de medo e de aventura. Algo de novo começava ali, naquele instante. A minha vida nunca mais seria a mesma, sentia-o! E na verdade, não foi!!
Hoje, tantos anos depois, não me arrependo de o ter feito, pois caso contrário, tudo teria sido bem diferente e não estaria aqui agora, a escrever sobre isto...
Lembranças guardadas nas prateleiras da memória e aqui revividas em forma de ecos
Rumos
Palavras
"Seja alegria, seja mágoa, ciúme
Pena de amor, ou grito de revolta
Tudo a palavra humana em si resume
Tudo arrasta suspenso á sua volta!
Palavras
Céu e inferno!
Cinza e lume!
Mistério que a nossa alma traz envolta!
Umas, consolação!
Outras, queixume...
Todas correndo como o vento á solta!
Tudo as palavras dizem
A verdade, a mentira, a crueldade...
Mas afinal, o que perturba e espanta
É o drama das que nunca foram ditas
Das palavras pequenas e infinitas
Que morrem sufocadas na garganta!"
(Virgínia Victorino)
Palhacinha
De
Cara pintada
Sorrio
Finjo que sou
Aquilo
Que não sou
Sorrio
Outra e outra vez
Desafio
Quem me olha
Brinco
Faço de conta
Olvido
Quem o mereçe
Grito
A quem não ouve
Sorrio
Mais uma vez
A ti amor
A ti amor
Que me buscas
No cimo dos montes;
A ti amor
Que me buscas
E não me achas
Na quietude dos montes;
A ti
Amor!
Nesta hora
Consigo este poema
De amor e saudade.
Achar-me-ás
Se com amor
Me buscares
Na quietude
Dos montes.
Estou
Junto a ti,
No teu coração,
Na quietude
Dos montes.
(Arganil
27_07_83)
Na ponta da lua...
Sentada na ponta da lua
Viajo no tempo que ainda não vivi
Desejos que me assaltam
De uma vida que me sorri
As estrelas são testemunha
Dos sonhos que me embalam
A brisa afaga-me o rosto
Num momento de magia
Tantas vezes imaginado
Num cenário de loucura
Quando me sento
Aqui
Na ponta da lua
Esperando-te
Tua presença
Eu aguardo
Nesta noite fria
E longa ...
Enquanto não chegas
Vou pintando teu rosto
Com olhos tristes
Espelhados na tua poesia
O sorriso ausente
E a voz ...
Essa tem de ser doce
Tuas palavras me encantam...
Escuto os teus passos
Cada vez mais perto
Tua silhueta escura
Confunde-se com a noite
Mas a tua alma é pura
E sabes que te espero...
Finalmente
Chegou o momento
Aquele
Que tanto quero!
Sonhei...
Tive um sonho estranho...
No meu sonho vagueava por sítios conhecidos, cruzáva-me com rostos familiares e andava em círculos, voltando sempre ao começo!
Todos os sonhos são bizarros, mas este era quase real, soava-me a qualquer coisa diferente...
No meu sonho, saltei um muro e do outro lado, encontrei amigos de infancia, aqueles com quem brincava á cabra-cega e ás escondidas.
De repente, o tempo recuou e tinha voltado a ser menina e ali me encontrava de novo a brincar com eles todos, mesmo aqueles que já partiram desta vida, foi uma sensação indescritível...
Depois, alguém me pegou na mão e me fez erguer no ar, até um sítio onde havia um alçapão que era preciso abrir.
Do outro lado via-se um céu de um azul luminoso, um azul que não existe... quase como que hipnotizada ía transpôr a barreira que me separava desse azul luminoso, quando algo inesperado aconteceu.
Um anjo de asas negras apareceu vindo do nada e, com uma das suas asas, empurrou-me de novo para baixo, não me deixando saltar para o lado de lá!
Não sei se há explicação para os sonhos, para este em especial, por ser meu, mas seja lá o que for, não deixou de me fazer pensar!!
Sózinhos...
Tantas vezes me pergunto... será que estamos sózinhos? Será este universo imenso só nosso? Num infinito cheio de estrelas e de planetas, não haverá mais nenhuma forma de vida? Porquê só nós?!
Tantos relatos de naves espaciais e fenómenos inexplicáveis, sem no entanto se chegar a certeza nenhuma...
E se de repente se descobrisse que afinal temos companhia? Será que olharíamos de forma diferente para o céu á noite? As estrelas brilhariam com a mesma intensidade aos nossos olhos?
Pois é! Perguntas sem resposta e que nos alimentam os sonhos de uma procura constante e incansável, na esperança de algum dia obter respostas.
E quando finalmente, algumas destas perguntas forem saciadas, iremos reflectir se afinal valeu a pena ou não!!
Trevas
Naquele dia
Em que o sol se apagou
Lembro a escuridão
Lembro o medo
A angústia...
Sem saber a razão
De tamanha injustiça
Naquele dia
Em que o meu dia se fez noite
E a minha alegria
Deu lugar á tristeza
Os sonhos suspensos no ar
Numa incerteza
De algum dia voltar
A ser aquela
Que tanto se ria
Que todos amavam...
Tal como relampago
Em dia de tempestade
Mergulhei nas trevas
Um vazio se instalou
E ao sabor do acaso
A vida parou...
Eu vi-te...
Eu vi-te um dia á tarde
Perdida em não sei que sonho
Se é fogo que em ti arde
Mãos no fogo por ti ponho
Perdida na cidade
Perdida em não sei que mistério
Por desvendar...
Quis saber do teu paradeiro
Elogiei o amor passageiro
Lembrei a saia
Lembrei o cheiro
Primeiro olhar
É o derradeiro!
(palavras que me foram oferecidas um dia por alguém e guardadas no meu baú... até hoje!)
Orgulhos
Como é possível?!
Duas pessoas que tantos momentos partilharam, tantas alegrias deram um ao outro, tantas gargalhadas soltaram , tanta cumplicidade...
Como é possível que agora se comportem como dois estranhos?!
Um gelo enorme os separa e ao mesmo tempo sente-se uma vontade incrível de o quebrar, mas o orgulho é mais forte!
Para quê?
Que se ganha com isso?
Afinal a vida é tão curta e o relógio não pára!!
Amanhã, quando nos dermos conta, o tempo já passou e tanta coisa ficou ainda por dizer, tantas outras gargalhadas ficaram por soltar e tantos outros momentos por viver...
Tudo por culpa desse orgulho estúpido e cruel.
A consulta
Lembro-me de uma longa caminhada que fiz na companhia do meu pai, que tudo fazia para minimizar a maleita que comigo tinha nascido.
Como a vila era distante da nossa aldeia, era preciso palmilhar muitos kilómetros até lá chegar!
Saltamos cedo da cama, ainda o sol não tinha raiado, nem se adivinhava perto sequer...
Depois do café da manhã e com um saco cheio de coragem, fizémo-nos ao caminho.
Ao fim daquela ladeira e depois de alcançar a estrada de terra batida, onde se poupavam uns bons kilómetros, caminhá-mos ao longo de pinheirais, de campos de milho, de caminhos de cabras e de atalhos, na esperança de encurtar o caminho!
Umas boas horas depois, finalmente chegámos ao nosso destino... a consulta no oftalmologista que se deslocava á vila uma vez por mês e á qual não se podia faltar!!
Era assim naquele tempo...
Asas de sonho
Neste areal descanso minhas asas
De um voo louco
Escuto as ondas
Que me trazem notícias de ti
As águas limpidas salpicam-me o rosto
As gaivotas fazem-me companhia
O sol incendeia-me o corpo
E as lembranças invadem-me os sentidos
Cresce em mim uma vontade
De te ver
De te sentir
De te beijar
De te amar
Vem
Quero abraçar-te com as minhas asas
Enrolar-te no meu corpo
Levantar voo em direcção ao céu
E quando estivermos lá bem no alto
Quero contigo planar...
vidas...
Nesta minha viagem pela vida , tenho encontrado gente com as mais variadas histórias e experiências. Lembro-me de uma em particular, que me fez pensar e muito!
É a história de um homem e de uma mulher que, como tantos outros, uniram suas vidas em nome do amor. Só uma coisa os torna diferentes dos outros, tiveram a coragem de acordar algo importante para a estabilidade da sua relação e que nem toda a gente estaria preparada para o assumir.
De vez em quando e em dias alternados, um deles tem liberdade para sair com quem quiser e bem entender, sem se ter de esconder do companheiro, e sem ter que responder a um questionario no dia seguinte... tudo em nome do amor...
Dá que pensar!!
Fera
Sou mulher
Sou fera
Sou felina...
Por uns desejada
Por outros ignorada
E por outros ainda... desprezada!!
No meu mundo há quem me acarinha
Neste meu mundo de brincar
Aqui encontrei amigos
Aqui tenho sempre pressa de voltar
É tudo tão diferente...
Navego feliz por este mar!!
Ao sabor do tempo
Tenho saudades daquele tempo...
Um tempo perdido no próprio tempo
Onde os dias me pareciam longos
Tanta pressa tinha de viver!!
Imaginava coisas que nunca tinha visto
Deitava a cabeça na almofada e sonhava...
Afinal esse tempo não foi assim há tanto tempo
E sinto que me escapa o tempo!!
Carta de despedida
"Se por um instante Deus se esquecesse de que sou uma marioneta de trapo e me oferecesse mais um pouco de vida, não diria tudo o que penso mas pensaria tudo o que digo.
Daria valor às coisas,não pelo que valem,mas pelo que significam.
Dormiria pouco,sonharia mais,porque entendo que por cada minuto que fechamos os olhos perdemos sessenta segundos de luz. Andaria quando os outros param,acordaria quando os outros dormem,ouviria quando os outros falam e como desfrutaria de um bom gelado de chocolate!
Se Deus me oferecesse um pouco de vida,vestir-me-ia de forma simples,deixando a descoberto não apenas o meu corpo,mas também a minha alma.
Meu Deus,se eu tivesse um coração escreveria o meu ódio sobre o gelo e esperava que nascesse o sol.Pintaria com um sonho de Van Gogh sobre as estrelas de um poema de Benedetti e uma canção de Serrat seria a serenata que eu ofereceria à Lua!
Regaria as rosas com as minhas lágrimas para sentir a dor dos seus espinhos e o beijo encarnado das suas pétalas...
Meu Deus,se eu tivesse um pouco de vida...não deixaria passar um só instante sem dizer às pessoas de quem gosto que gosto delas.
Convenceria cada mulher ou homem que é o meu favorito e viveria apaixonado pelo amor...
Aos homens provar-lhes-ia como estão equivocados ao pensar que deixam de se apaixonar quando envelhecem,sem saberem que envelhecem quando deixam de se apaixonar!
A uma criança,dar-lhe-ia asas,mas teria de aprender a voar sozinha.Aos velhos ensinar-lhes-ia que a morte não chega com a velhice,mas com o esquecimento.
Aprendi que um homem só tem direito a olhar outro de cima para baixo quando vai ajudá-lo a levantar-se...
Tantas foram as coisas que aprendi com vocês,os homens!
Aprendi que todo o mundo quer viver em cima da montanha,sem saber que a verdadeira felicidade está em subir a encosta...
Aprendi que,quando um recém-nascido aperta,com a sua pequena mão,pela primeira vez,o dedo de seu pai,o tem agarrado para sempre.
São tantas as coisas que pude aprender com vocês,mas não me irão servir realmente de muito,porque,quando me guardarem dentro dessa maleta,infelizmente estarei a morrer..."
LEMBREM-SE:
"TUDO O QUE ACONTECE,ACONTECE POR UMA RAZÃO."
(carta escrita por Gabriel Gárcia Marquez aos seus amigos,em seu leito de morte)
Miragem
Há dias em que me sinto assim... sei lá porquê!!
Ás vezes penso que sou como o vento, que sopra, ora forte... cavalgando por montes e vales, com uma força divina que tudo alcança sem medo e tudo domina, obrigando seres insignificantes a ajoelharem á minha passagem... outras vezes fraco, como uma leve brisa, que ao passar,mal se sente e passa despercebida por entre folhagens e rostos de pessoas, que mal se apercebem da minha presença...
devaneio
Nesta quietude que me perturba
Passeio contigo de mãos dadas
Fecho meus olhos na penumbra
Deixo entrar as fadas...
É um mundo de sonho
Tudo é possível
Minhas mãos em ti ponho
Tudo é incrível
O sol brilha
O mar acalma
Nesta minha ilha
Do fundo da alma
Ditado
Naquele tempo lá longe,mas guardado na memória como se tivesse sido ontem;recordo a rapariguinha de corpo franzino e óculos grossos, que tanto a entristeciam e a faziam perguntar,sem no entanto obter resposta:
_Porquê eu?
Na escola era gozada pelos colegas,que nunca se cansavam de a inferiorizar por isso.
A carteira da frente estava sempre reservada para ela! Mais uma vez a pergunta se impunha:
_Porquê eu?
Era dia de ditado e os corações ficavam apertadinhos...
A professora com o seu ar austero e poderoso,não se cansava de ditar palavras que,cada um tentava a todo o custo,escrever sem errar,porque se isso não acontecesse, as mãos iriam ficar roxas e a esformigar por bastante tempo.
Ditado acabado,era hora da recolha dos cadernos e, mais uma vez os corações ficavam apertadinhos...
Um a um,os nomes dos desafortunados,foram sendo chamados e ordenavam-se em fila, para receberem as réguadas do costume! Mais uma vez, o nome dela não foi ouvido!! Afinal a rapariguinha de corpo franzino e óculos grossos, que os colegas gozavam, era só aquela que nunca dava erros no ditado!!
Tempo...
Em questão de segundos apaixonamo-nos por alguém,mas levamos uma vida inteira para esquecer alguém especial !!
(desconheço o autor)
Partida
Na estrada da vida, temos muitos momentos em que nos interrogamos se realmente vale a pena continuar...
Por vezes, fujimos de obstáculos,contornamos dificuldades,fechamos portas e abrimos janelas...
Seguimos em frente,sempre guiados pela esperança e olhando o horizonte!
Mas...nem sempre é fácil e a vida prega-nos partidas!
Hoje recordo aqui um amigo que partiu...
Guardo na memória todos os momentos alegres que me proporcionou e as gargalhadas que ambos demos, resultantes de episódios caricatos e de leituras de cordel que ele tanto gostava...
Pessoa de fácil acesso e extremamente bem disposta que todos estimavam e respeitavam.
Nunca tive oportunidade de lhe dizer o quanto o apreciava,mas acho que ele sempre o soube...
Até já amigo!!