Lembranças guardadas nas prateleiras da memória e aqui revividas em forma de ecos
12/02/2006

Pés descalços...


Num tempo em que tanto se fala de pobreza, não posso deixar de me lembrar de uma história que o meu pai contava sempre.
Já o sol ía alto, quando o pobre homem se assomou á soleira da porta e, num gesto humilde, perguntou se podia entrar.
_Bons dias!
_Bons dias!
_Ó senhor, não tem por aí alguma coisinha que não lhe faça falta, que me dê?
O seu olhar era tão triste e suplicante, que não haveria ninguém que não se comovesse.
Vestido de trapos e com pés descalços, ali estava um pobre desgraçado que, para poder sobreviver, calcorreava de terra em terra pedindo esmola aqui e ali.
O meu pai, disse-lhe para esperar e subiu as escadas que davam para o andar de cima, onde foi procurar por algo que pudesse amenizar a fome daquele pobre homem.
Além de um prato de sopa e de um naco de pão com sardinha frita, trouxe também um par de botas que já não usava, por lhe terem feito uns calos nos pés.
_Tome. Coma á vontade e depois veja lá se estas botas lhe servem.
Os olhos da pobre criatura, até marejaram de tanta alegria ao ver as botas ainda na mão do meu pai, mas que daí a nada, estariam nos seus pés. Nunca tal imaginou, quando ali chegou e apenas pediu algo de comer...
Depois de sossegar o estomago, pegou nas botas e começou a calça-las. Puxava puxava, e o raio das botas não entravam, nem uma nem outra!
_Parece que não querem entrar... não lhe servem...
_Servem servem, meu senhor, eu é que tenho os pés inchados...
Agradeceu muito e lá foi, com o estomago composto , botas ao ombro e os pés descalços...
É claro que as botas não lhe serviam, nem quando os pés desinchassem, mas eram suas, as botas que acabava de ganhar!

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